Maria do Céu é a caçula da família do Amigomeu. Como os
demais irmãos, tem no nome a marca de uma personalidade forte do pai deles,
o seu Waldemar. Rapa do tacho de uma família de seis filhos, foi batizada assim
porque essa foi uma das entusiasmadas expressões que o pai dela ouviu da esposa no
momento da concepção. Seu Waldemar contou um dia, depois de ter tomado umas
cachaças no churrasco, que aquela noite tinha sido o maior momento de sexo que sua mulher,
Dona Idalina, tinha vivido. Quando a filha nasceu, ainda se lembrando daquela
noite, ele pensou em botar no nenê o nome de Minha Nossa Senhora, mas achou que
ia ficar muito cumprido e a registrou como Maria do Céu. Se ele tivesse contado ao escrivão do cartório o motivo do nome e, se o funcionário fosse letrado, certamente teria colocado uns dois pontos de excla
mação ao lado do nome dela na certidão.
mação ao lado do nome dela na certidão.
Maria do Céu
trabalhou bastante na vida, primeiro ajudando a mãe nas lidas da casa. Depois,
quando se mudou para Bagé com a família, foi balconista de uma livraria, cuidou
de enfermos e estudou o ginásio no Instituto São Pedro, no bairro Povo Novo, também
conhecido como Getúlio Vargas. Aliás, Getúlio era o nome do irmão mais velho, que ganhou esse nome por causa da admiração do pai pelo presidente. Seu Waldemar não admitia alguém dissesse na sua frente que o presidente de São Borja tinha sido ditador. Além do Amigomeu,
cujo nome foi uma homenagem que seu Waldemar quis fazer a um vizinho, do qual
esqueceu o nome na hora de registrar, Maria do Céu era irmã também de Deudeci,
talvez a mulher mais magra do mundo, de Deuseamor, o Momô, que virou pastor e foi
morto por engano pouco depois de sair do templo, e Amaralina, em homenagem a
uma garota que seu Waldemar conheceu em uma praia de Salvador durante uma viagem.
Quando veio com Momô, Deudeci e Amigomeu para Porto Alegre, Maria do Céu arrumou um emprego. Mas
trabalhava tanto, sofria tanto com as correrias da cidade grande, chegou a um
ponto de estafa tão grande que acabou tendo problemas de cabeça. Quando a
aconselharam a fazer terapia, consultou um psiquiatra, que também atuava como médium em um centro espírita
nas horas vagas. Logo que começou a relatar suas angústias, o médico perguntou se ela ouvia
vozes.
- Sim. Ouço
frequentemente vozes estranhas, algumas de gente que falava coisa sem sentido e
a maioria como se estivessem bêbadas.
- Isso é muito comum – acrescentou o psiquiatra com um ar de
quem conhece tudo sobre este e sobre o outro mundo.
Foi então que fez a pergunta mais importante:
- E desde quando tu ouves essas vozes, minha filha?
- Desde que me trocaram de turno e comecei a trabalhar à
noite no Diário Gaúcho. Eu sou telefonista.
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