sábado, 21 de setembro de 2013

CONSIDERAÇÕES SOBRE O HINO RIO-GRANDENSE

Partituras do hino rio-grandense escritas em 1938
Maestro Joaquim Mendanha
A parte melódica do hino rio-grandense foi criada após a vitória dos farroupilhas no Combate de Rio Pardo, em 30 de abril de 1838. Além de vencer a batalha, os farrapos prenderam uma banda, liderada pelo maestro mineiro Joaquim José de Mendanha, que era um músico famoso e considerado um grande compositor. É difícil saber ao certo o que aconteceu, mas a verdade é que Mendanha foi “convencido” a compor uma peça que homenageasse a vitória das forças farroupilhas.
  O fato é que o maestro concordou em compor uma música que, segundo alguns autores, era um plágio de uma valsa do austríaco Strauss. Aí, o capitão Serafim José de Alencastre escreveu uma letra que tecia loas à tomada de Rio Pardo. A harmonização ficou a cargo de Antônio Corte Real. Quase um ano depois, uma nova letra foi composta por um autor de quem não se guardou o nome. Em 1933, quando eram feitos preparativos para o Centenário da Revolução Farroupilha, surgiu uma terceira letra, que caiu no gosto popular e ficou como versão definitiva. Era criação do poeta e compositor Francisco Pinto da Fontoura, conhecido também como Chiquinho da Vovó. 
  Já no ano de 1966, durante a Ditadura Militar, essa melodia e essa letra foram oficializadas como Hino Farroupilha ou Hino Rio-grandense força de lei. Para isso, foi cortada a segunda estrofe da letra original de Chiquinho da Vovó que dizia:

Entre nós reviva Atenas
Para assombro dos tiranos;
Sejamos gregos na glória,                                                                        E na virtude, romanos. 
 Talvez a palavra “tiranos” não tenha soado bem aos militares.
O hino então ficou assim:
Como a aurora precursora
Do farol da Divindade
Foi o 20 de setembro,
O precursor da liberdade.
(Da mesma forma que as cores do amanhecer indicam a chegada do sol, o dia 20 de setembro foi o início do caminho em busca da liberdade)

Estribilho
Mostremos, valor, constância,
Nesta ímpia e injusta guerra
(Mostremos garra, persistência, nessa guerra impiedosa e injusta)
Sirvam as nossas façanhas
De modelo a toda terra
(Que nos nossos feitos influenciem outras nações em busca de liberdade)

Mas não basta para ser livre
Ser forte, aguerrido e bravo.
Povo que não tem virtude,
Acaba por ser escravo

Foi lamentavelmente uma ironia que o hino falasse nisso já que os próprios brasileiros escravizavam os negros. Que virtudes faltariam a esse povo para livrá-lo da escravidão? Que virtudes teve um povo que prometeu liberdade aos escravos e os traiu. Os negros foram traídos pelos dois lados. O império anistiou seus inimigos, mas mandou que os escravos que lutaram contra ele voltassem para as senzalas do Rio de Janeiro. Depois de terem permitido que os próprios negros fossem massacrados no Combate de Porongos, desarmando-os, antes do combate iminente, farroupilhas assinaram a paz concordando que os negros não fossem anistiados. Justiça precisa ser feita ao general farroupilha Antônio de Souza Neto que se exilou no Uruguai e levou consigo os negros que com ele combateram. Os farroupilhas, como os imperiais sempre foram escravagistas antes e depois da Guerra dos Farrapos. Os escravos só viriam a ser libertados em 1884 em alguns lugares e oficialmente, em todo o país, em 1888.
 

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

DESPRETENSIOSAS REFLEXÕES SEMÂNTICAS SOBRE TERMOS GAUDÉRIOS

Já comentei aqui sobre o meu gosto de me debruçar sobre alguma palavra ou expressão para analisar a origem. Hoje, colhi na bateia uma pepita interessante da tradição gaúcha e comecei a raspá-la para mostrar seu verdadeiro brilho. É a palavra "china". Não encare isso como algo acadêmico porque não é. Não fiz longas e extenuantes pesquisas nem cito aqui nenhum pensador ou pesquisador renomado. É apenas uma digressão baseada em leituras aleatórias e em um processo de ligação de significados.
China, termo usado para definir uma mulher gaúcha, já foi bem mais conceituado do que agora. Designava a companheira do gaudério e tinha esse nome porque fazia menção à fisionomia da mulher de então com traços semelhantes às chinesas, quando na verdade eram indicações da herança indígena. Também a tonalidade da fisionomia levava às chinesas mas igualmente às índias brasileiras. A partir da cor de cuia, criava-se o termo morena, derivativo dos mouros, também presente no DNA de muitos portugueses e espanhóis já que os árabes muçulmanos da Mauritânia, no noroeste da África, de tez escura, dominaram a península ibérica por mais de 400 anos, convivendo com esses dois povos.
O termo china era uma referência à forma carinhosa que o gaúcho chamava a sua companheira. Mas o nome foi sofrendo uma mudança a partir da evolução dos próprios gaúchos do pampa, que cresciam economicamente com o produto da agricultura e da pecuária, mais especificamente a charqueada. Igualmente a chegada de outros povos europeus contribuiu para isso. Com isso, tinham condições financeiras para enviar seus filhos para estudos na Europa, mais especificamente na França. 
A partir daí, a preferência para chamar a mulher do gaúcho mais rico, nas fazendas, era a de prenda, termo que tem um significado de presente, regalo ou bibelô. Para alguns, não combinava chamar de china às suas alvas mulheres. O termo foi ficando mais para as mulheres pobres, companheiras de gaúchos igualmente sem posses ou sem eira nem beira. Foi se tornando cada vez mais pejorativo que passou a denominar as mulheres sem virtudes, dentro do conceito do que era isso no entendimento das classes dominantes. Até mesmo os próprios gaúchos acabaram assimilando essa troca de significados. Chinaredo, que antes era somente um conjunto de mulheres, tomou o sentido de bordel. Até mesmo o prato típico conhecido inicialmente por Arroz de China Pobre, passou a se chamar, até nos dias de hoje, Arroz de Puta Pobre. Restou para as mulheres gaúchas o termo Chinoca, que nunca sofreu qualquer discriminação.

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

OBSERVANDO UM PEDAÇO DO HINO RIO-GRANDENSE À LUZ DA GRAMÁTICA

Nunca tive paciência nem habilidade para montar pecinhas de lego, jogar videogames ou me entregar a esses joguinhos do Facebook para os quais  vivem me convidando. Prefiro me divirtir muito com análises gramaticais e com o a observação da semântica das palavras. Mesmo sendo gramático amador, já que não desenvolvi estudos mais profundos e acadêmicos sobre a língua portuguesa, me amarro demais nas nuanças do idioma.
  Daí que, de vez em quando, me encarno em algumas palavras ou expressões. Agora mesmo, em tempos de festejos farroupilhas, de tanto ouvir e ler sobre o hino rio-grandense, me chamou a atenção a variada grafia que produzem de uma parte dele. Já li “de modelo a toda terra”, “de modelo a toda a Terra” e até “de modelo à toda a Terra”, ou “à toda terra”. Daí que vamos por parte, como diria o Jack, o Estripador montando lego (não consegui deixar de roubar isso do meu amigo Paulo Motta).
  Meu sonho seria pôr os olhos no original do hino-grandense, nessa letra para a música do maestro Mendanha, criada por Francisco Antônio da Fontoura, o Chiquinho da Vovó, a terceira e definitiva versão, oficializada em 1933, durante as preparações para o centenário da Revolução Farroupilha. É que eu queria ver se ele colocou “de modelo a toda terra ou de modelo a toda a Terra.” No primeiro caso, as façanhas gaúchas serviriam de modelo para qualquer terra, ou seja, para qualquer nação. No segundo caso, também megalomaníaco, indicaria modelo para todo o nosso planeta, o que daria na mesma coisa. Acredito que Chiquinho da Vovó optou por dar exemplo a qualquer terra.
  Embora venha lendo na internet, e até mesmo em jornais, a expressão com crase, ela é totalmente inexistente nesse caso. Crase é um resultado da fusão entre o artigo definido “a” e a preposição “a”. E isso não se verifica em “de modelo a toda terra”. Para entender isso, basta saber que ‘toda é um pronome indefinido que, lógico, não é precedido por artigo definido. Por isso, não há a fusão. “Ah, mas eu acho bonito usar crase porque dá um aspecto mais elegante”, me diria alguém que não se satisfaz em seguir uma norma estabelecida. Bem, nesse caso, eu sugeriria mudar a frase para “de modelo à Terra inteira” e aí não estaria errado, mas não seria o hino do Chiquinho da Vovó.

Veja, a seguir, uma decodificação de todo o Hino Rio-grandense.


quarta-feira, 18 de setembro de 2013

PENSAMENTO EM TEMPOS DE RECORDAÇÕES DO PASSADO

A carreta é uma jangada que singra o verde mar das coxilhas. E o boi, coitado, segue como vento.


O laço é o braço mágico do peão, usado para segurar o animal que não está tão perto. É como a boleadeira, com a diferença que essa técnica dos índios charruas agarrava mamíferos e inhandus (emas) pelas patas.

RE(DES)CONSTRUINDO DITADOS ANTIGOS

QUEM SEMEIA VENTOS COLHE TEMPESTADES – Não é bem assim. O vento que arranca tudo o que encontra pela frente é o mesmo que empurra decisivamente a vela do barco, que move pacientemente a pá do moinho, que segura a pandorga plasticamente no ar. O que o difere da tempestade é a intensidade e o descontrole que a faz destruir tudo. Por isso, esse ditado deveria ser mudado para: QUEM COLHE TEMPESTADE FOI PORQUE NÃO CUIDOU DO VENTO QUE SEMEOU.
  Na foto que ilustra este post, feita com maestria pelo meu ex-colega Genaro Joner, que a publicou no Facebook, serve para ajudar a mostrar a beleza de um dia de vento. 

sábado, 7 de setembro de 2013

AMIGOMEU NO ACAMPAMENTO FARROUPILHA

Encontrei o Amigomeu no Acampamento Farroupilha. Ele ajudou a montar um piquete, serrando e pregando tábuas e agora está trabalhando como assador.  Pilchado da cabeça aos pés, parece um personagem do filme do Capitão Rodrigo, com uma cuia de chimarrão que dança um floreio entre o ato de matear e a ida para o reabastecimento na cambona de água sempre quente na beira do fogo de chão. Usa chapéu com barbicacho e sempre toca a aba larga com a mão direita quando quer cumprimentar alguém. Amarrado no pescoço por um nó que levou tempo para aprender, ele ostenta um lenço colorado e veste uma camisa branca, de algodão, e uma bombacha larga cujas pernas se enfiam em uma bota preta com cano que muito sucesso fez em bailes da Campanha.
 Sorriso franco e permanente no rosto, só se transfigura se alguém diz que ele está fantasiado de  gaúcho. Com um semblante sério, diz que não é fantasia,  é traje de gala, uma pilcha, que ele não usa o ano inteiro. Para os que gostam de uma prosa mais comprida, ele pergunta se é simpático perguntar a um admirador do samba se ele está fantasiado de sambista quando sai por aí durante os ensaios de carnaval vestindo uma camisa listrada, um chapéu panamá e um mocassim branco. Ou então dizer que está fantasiada de jogador a pessoa que veste camiseta e meia com o fardamento de Grêmio ou Inter ou até do Barcelona da Espanha.
Também perde um pouco o humor quando recebe a visita de vegetarianos, veganos e outros seres diferentes dos gaudérios. A questão é que ele é o churrasqueiro do piquete. Já teve que ouvir poucas e boas sobre o costume de comer carne, mas também já se surpreendeu de ver sair dali, lambendo os beiços, um sujeito que até havia pouco desfiava uma ladainha sobre o assunto. Por que alguém vai a um acampamento gaudério sabendo que vai encontrar o que não gosta, é o que Amigomeu sempre pergunta a si mesmo e, às vezes, para esse tipo de visitante.
 No sábado, ri muito como sempre acontece quando encontro Amigomeu.  É que havia chegado um grupo de japoneses interessados em conhecer a cultura gaúcha. Era bonito de se ver o intérprete rindo muito mais do que um japonês costuma rir ao tentar traduzir aos compatriotas os causos que Amigomeu contava. Enquanto o taura falava, os japoneses abriam os olhinhos o mais que podiam e ficaram sérios, esperando a tradução. Aí desandavam a rir. Sei lá o que o tradutor dizia para eles. Uma das coisas mais engraçadas que ouvi foi a explicação de Amigomeu para os dois cavalinhos que havia no piquete, como se japonês não conhecesse pôneis:
- E uma espécie de bonsai do cavalo. Mas não é o petiço, que esse é um cavalo que Deus encurtou as patas.

Até o Mazaropi e sua senhora estão na festa


Para conhecer algumas palavras e expressões ditas no Acampamento Farroupilha acesse http://migre.me/fZsz2

MAURO CASTRO LANÇA SEU SEGUNDO LIVRO SOBRE HISTÓRIAS DE PASSAGEIROS E TAXISTAS

 Meu amigo Mauro Castro estará lançando, na próxima segunda-feira, a partir das 19h30min, o seu segundo livro. Taxitramas Diário de Um Taxista, Volume II, terá coquetel de lançamento na Companhia de Sanduíches com sessão de autógrafos e um bate-papo com o autor.
  O evento tem apoio do Diário Gaúcho, no qual o autor escreve uma coluna às segundas-feiras, da Cartaxi Publicidade em Táxis e da Evangraf. O segundo livro está sendo lançado sete anos após o primeiro volume, com 176 páginas, recheadas de histórias curiosas sobre o cotidiano dos motoristas de táxi.
  A Companhia de Sanduíches está localizada na esquina da Avenida Getúlio Vargas com Rua Saldanha Marinho, no Bairro Menino Deus, em Porto Alegre. O local é ao lado do ponto de táxi em que Mauro Castro trabalha. Ali começa a maioria das histórias que escritas com muito talento e publicadas no Diário Gaúcho, no site www.taxitramas.com.br.
  Se você quiser ganhar um exemplar, deixe uma mensagem aqui no Vidacuriosa para participar do sorteio. O ganhador receberá o livro pelo correio sem qualquer custo.