terça-feira, 23 de julho de 2013

A HISTÓRIA DE DEUDECI, A MULHER MAIS MAGRA QUE CONHECI

Amigomeu é um cara meio tosco, nasceu lá no Interior do Rio Grande do Sul há uns bons anos quando não havia ainda a televisão nem redes sociais de computador. Cresceu cuidando dos bichos do campo, e andando entre os arvoredos, o trigo, o arroz  e as chircas, que são um tipo de arbusto com o qual se improvisava vasssouras. Por isso, tinha essa falta, digamos assim, de finesse. É meu amigo de infância, de adolescência e de maturidade. Ele é de uma família com seis filhos, a maioria deles com nomes estranhos, assim como o do próprio Amigomeu Silva da Silva, que teve o nome registrado em homenagem a um amigo do pai dele.
Deudeci é irmã de Amigomeu. Recebeu esse nome por causa mais uma das maluquices do pai dela. Seu Waldemar, ainda jovem, ouviu, no  cabaré da Picucha, uma conversa entre duas chinas. Elas falavam de uma vizinha, moça de família, que havia transado várias vezes antes do casamento, o que, naquela época, era motivo de comentários maldosos.
- Ela deu o que era dela. E, se deu de si, está bem dado – disse uma das mulheres.
Não se sabe por que cargas d’água, seu Waldemar ficou com esse nome na cabeça. Nem pensou no sentido, só achou bonito o “deu de si”. Anos depois, casou-se e botou o nome do primeiro filho de Getúlio, porque era fanático por Vargas, apenas na fase democrática do presidente, mas não na época da ditadura. E aí começaram os nomes estranhos. Depois de registrar o Amigomeu, botou o nome na primeira filha de Deudeci. Os outros passaram a se chamar Deuseamor, o Momô (assassinado por engano), Amaralina e Maria do Céu.
Pois falemos então de Deudeci. Ela era a pessoa mais magra que eu conheci. Quando pequena, não usava o portão para sair de casa. Ficava de perfil e passava pelo meio das grades. Na escola, sofreu constrangimentos, o que hoje se chama de bullying. Ganhava um apelido atrás do outro como Fininha, Letra I e Caniço. Teve uma época que um grupo de colegas esperava que ela entrasse na escola para gritar, em coro: “Agora podemos ir pescar. O caniço já chegou!"  Amigomeu sempre defendia a irmã. Às vezes, saía no braço com quem debochava da menina. Como aquilo não parava e eles andavam em grupo, Amigomeu decidiu se vingar. Pediu a um tio caçador que lhe conseguisse um punhado de bosta de capincho para misturar no Q-Suco dos maus colegas da irmã. Como o tio demorou a atender seu pedido, Amigomeu foi na venda e comprou três envelopes de um purgante. Os guris se distraíram, e Amigomeu botou o laxante nas garrafinhas deles. “A correria e os rastros no chão foram uma coisa linda de se ver”, contava Amigomeu, anos depois, às gargalhadas.
Certa vez, quando era adolescente, Deudeci acompanhou a mãe a uma loja em Bagé e, como era tímida, ficou ali no cantinho, perto da porta. De repente, chegaram duas madames, tiraram seus casacos e largaram em cima da magrinha no exato momento em que ela estava se espreguiçando. Pensaram que era um cabide. Para sorte delas, Amigomeu não estava junto.
Foi então que seu Waldemar ficou preocupado. Prendeu um cavalo na carroça, botou a filha na boleia e se mandou para Bagé em busca de um especialista. E lá se foram debaixo de um sol de matar, em uma época em que uma das estiagens mais brabas castigava a região. Lá pela Trigolândia, distrito de Hulha Negra, eles passaram por um conhecido, que estava a cavalo. Ao cumprimentá-los, o amigo comentou:
- Mas e que tal, seu Waldemar? Até onde vai essa seca?
Triste, o pai do Amigomeu respondeu:
 - Pois então. Ela não tem jeito de engordar. Estou levando no médico.
O homem ficou encabulado, ia desfazer o mal-entendido, mas resolveu dar um adeus, rebenqueou o cavalo e se tapou de poeira.


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